O caderno de notas de Antônio Parreiras é um caderno com noventa páginas manuscritas onde o pintor registrou observações sobre a arte e sobre questões técnicas da prática artística, especialmente sobre a pintura a óleo. Entre suas anotações Parreiras escreveu:
“A experiência se adquire com o conhecimento das coisas, pela prática, pela observação e, muitas vezes, pelo acaso. Eis o que ela me ensinou. Nunca pintar sobre um desenho feito a lápis. Com o tempo, este desenho romperá a camada da tinta e virá à superfície. Não pintar escuro sobre um tom claro; fatalmente, em pouco tempo aparecerão rachaduras. Evitar todos os pretos. O melhor se obtém com ultramar e carmim. O azul empregado no momento torna-se preto horas depois…
Quando me disponho a pintar paisagem não penso jamais em fazer quadros, penso em fazer os estudos para fazer uma paisagem. Um trecho de natureza, copiado tal qual ela se nos apresenta, não dá jamais “quadro”. O quadro é uma “interpretação”, e não uma cópia. Quem o produz não é a “natureza”, é o artista. Esta auxilia, inspira tão somente. A fotografia reproduz a natureza em todos os seus detalhes, já lhe dá até a cor, mas o que não lhe dará jamais é a alma; ficará sempre no limite das coisas materiais que podem ser produzidas por todo o mundo, uma vez que se pratique. Vou, pois, ao natural apenas munido do meu álbum. Se encontro o que me impressiona, desenho. Logo descubro, assim, as dimensões que deve ter a minha tela, e habituo-me à linha e à cor…
Há artistas e artistas. Uns são criadores, outros máquinas, boas ou más, mas sempre máquinas. Destes estão repletos os grandes museus da Europa, onde passam a vida a copiar mecanicamente, embora com uma perfeição às vezes tão pasmosa que não se distingue a cópia do original. No fim de uma longa existência de trabalho apurado, desaparecem sem deixar vestígios. A par destes que ainda são honestos, pois não ocultam a origem dos seus trabalhos, há os que produzem aproveitando sabiamente o que outros produziram. Tiram de um, um pouco, de outro, outro pouco, e apresentam como coisa sua. E como no que fazem não há unidade, não há perfeição, não há expressão, não há sinceridade, classificam suas produções como filiadas a uma orientação moderna, as quais primam pela falta de correção devido à deficiência do autor que desenhou mal porque copiou o que não viu, posto que quem viu foi o outro. Em geral essas produções são confusas. É preciso um longo trabalho para saber o que elas querem dizer, pois constituem um conjunto formado por diversas outras produções.