“As instituições se repensam, museus se multiplicam…”

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Na contramão a ideia de que não há mais necessidade de espaços expositivos formais, mais as instituições se repensam, museus se multiplicam e o mercado de arte se organiza para receber os mais variados formatos e suportes
O curador e pesquisador Leno Veras é enfático. “Acredito que, mais do que nunca, precisamos de museus”, diz. “Necessitamos, com urgência, refletir sobre a condição contemporânea desta instituição, cuja função primeira, e última, é socializar memória. Em tempos como os de hoje, é preciso dar a ver como se escreve a história, por meio de que e com qual intuito os discursos são engendrados. O museu, em sua convulsão como mecanismo de controle das temporalidades, é, hoje, uma heterotopia pela qual é preciso, sobretudo, lutar”.
 O necessário é o museu gerador de conhecimento, que seja um instrumento para reflexão sobre o que já sabemos, mas não elaboramos, museus inquietos que produzam insights reais e não sejam apenas experiências de marketing – ou como define a curadora Júlia Rebouças: “Os museus devem ser repositórios e fomentadores de práticas experimentais de criação e o espaço do livre pensar”, diz. “Nesse sentido, importa que as instituições sejam permeáveis ao presente e abertas às questões colocadas pelo espaço onde estão inseridas, ainda que sua coleção remeta a outros contextos e temporalidades. Importa que resistam a projetos cerceadores que tentam aplacar a potência disruptiva da arte”.
A reflexão sobre o papel dos museus ajudou a questionar menos a ideia da instituição e mais a sua relação com a sociedade e sua vocação como auxiliar da construção cultural, abrindo mão da cobrança de ser um catalisador que viesse a refletir a produção artística de uma era. “Nenhum museu efetivamente consegue ou sequer deveria tentar refletir a produção artística de uma determinada época. Essa ideia por si só é autoritária, colonialista e reducionista”, diz o artista visual e pesquisador Bruno Moreschi. “Museus não devem se justificar por intenções totalitárias de conter em seus espaços uma ideia falsa do todo, limitando a própria ideia de produção artística, mas de ser um local organizado a partir de escolhas ideológicas claras”.
Museus, galerias, centros culturais, mais do que executores de responsabilidades, são os lugares de encontro com o pensamento dos artistas, com a intenção do curador, com a observação do outro é ali que nos deparamos com o lugar mágico da exposição, o olho no olho com a obra que coloca o espectador em estado de alerta.
A liberdade do museu não está vinculada ao seu projeto arquitetônico ou ao seu compromisso institucional, mas com o seu pacto em proporcionar conexões semânticas sócio-políticas-culturais, dar voz à multiplicidade de pensamentos e ter coragem em defender a liberdade irrestrita da obra de arte, dos seus artistas e suas ideias. Essa é a única maneira do cubo branco se transformar em caixa de Pandora.
Fonte ; (trechos) Liberdade dentro da Caixa por Helena Bagnoli